domingo, 1 de novembro de 2015

Para que servem as emoções?


Outro dia estava em um shopping esperando uma amiga, e havia um quiosque vendendo livros infantis. Fui olhar e me interessaram os de conhecimento, como O corpo humano e Cleópatra. Dentre os vários títulos, um me chamou a atenção: O grande livro das emoções.

Emoções parecem ser um assunto piegas. Ou óbvio. #SQN.... É só observar a quantidade vendida do livro Inteligência Emocional, que fez a fama de Daniel Goleman (e hoje ele tenta falar sobre outros assuntos, mas continuam a insistir que ele fale sobre inteligência emocional - ver Inteligência emocional não é tudo) para ver que o tema não é tão piegas ou óbvio assim.

                Eu mesma já tratei várias vezes sobre emoções nesse blog (Dica de livro - O Erro de Descartes, Isso é irracional!, Afinal, por que a vergonha existe?), especialmente defendendo que as emoções não são contra a racionalidade. E por que insisto em falar disso? Porque percebo que as pessoas não internalizaram isso, e que ainda há carência dessa discussão. Continuo ouvindo “seja frio e racional”, por isso penso que o debate continua de pé, e é necessário que esteja na mesa de discussão.

                Voltando ao livro que acabei comprando no quiosque, O grande livro das emoções, que supostamente tem como público-alvo crianças. O que me encantou nele foi a simplicidade com que explicou as funções das emoções. O livro se divide em três seções “A partir de mim...”, “Quero chegar...” e “Até os outros...”, com contos em cada capítulo (storytelling S2).


                “A partir de mim...quero chegar...até os outros: a partir de si mesmo, com seu jeito de ser...você quer ir, quer se aproximar dos outros para ter uma boa relação com eles.” (p. 8)


               
Gente, não são encantadoras essas coisas planejadas para ensinarem crianças, e que na verdade os adultos aprendem muito também? (Tipo DivertidaMente...amei...e tem tudo a ver com esse tema). Claro, os materiais que visam a ensinar crianças quebram o conhecimento em pequenas partes digeríveis e o apresentam de modo lúdico e agradável, quem não gosta disso?

          Voltando, na primeira parte tratam de mostrar a importância de identificar e entender a função das emoções em nós mesmos, como medo, ira, tristeza, depois de emoções que nos ajudam a chegar até os outros, e finalmente as que realmente são cruciais para convivermos com os demais, como empatia, gratidão, perdão.

                O livro mostra de maneira leve e elegante que as emoções têm uma função essencial, que é permitir a convivência social:


               
Tenho certeza de que você é um menino ou uma menina que deseja conviver de modo agradável com os outros, que quer se sentir à vontade entre seus colegas, ser aceito em seus grupos e que eles queiram estar com você. Você sabe que nem sempre isso é fácil. Em cada história, você vai descobrir um pequeno segredo que o ajudará a conviver melhor com aqueles que o rodeiam.” (p. 06)


          Genial! Tirou as emoções do lado negativo – do descontrole, desequilíbrio, falta de racionalidade, fraqueza, impulsividade – e as colocou no lado da... normalidade. O lado de ser um humano que funciona! Mensagem parecida traz DivertidaMente, em que as emoções fazem parte do nosso funcionamento normal.

               Claro que há emoções que podem nos levar a atos não tão aceitáveis, como eles mesmos citam – vingança, impulsividade, tristeza etc. Ainda assim, elas fazem parte de quem somos, e se soubermos identificar e tomar uma decisão melhor a partir delas, ótimo. O x da questão é entender que as emoções têm uma função sim, que não são opostas à racionalidade e que não nos fazem ser piores, mais fracos ou não nos levam só a escolhas ruins. Na verdade, elas permitem ser quem somos.

              
 Bom, vamos falar um pouco mais sobre emoções. Para começar, essa área de estudo foi por muito tempo deixada em segundo plano na psicologia considerada mais experimental e científica, justamente por se achar que era de menor importância, longe do campo intelectual. De acordo com a Enciclopédia de Ciências Cognitivas do MIT, as emoções por si apenas se tornaram um tópico científico legítimo nas últimas décadas.

        Assim como vários outros conceitos, há divergências entre autores sobre definição e funcionamento, por isso vou eleger um para seguir, que é meu preferido para esse tema, o neurocientista Antônio Damásio.

Emoções são o que acontece no teatro do corpo, e sentimentos são o que acontece no teatro da mente (em O erro de Descartes).

As emoções são o conjunto de modificações fisiológicas do corpo, e os sentimentos são o reconhecimento e percepção dessas modificações, por isso os sentimentos seriam mais exclusivamente humanos, enquanto as emoções ocorrem largamente em outros animais.


(Só um parêntesis)

Didaticamente, alguns dividem o estudo do ser humano na psicologia em: emoção, cognição, comportamento e motivação. Então emoções não são cognição (estudo das funções da mente como memória, atenção, linguagem, raciocínio, tomada de decisão – o lado mais intelectual e da inteligência “fria” como costumavam compreender), comportamento (ação visível, atuação no ambiente) e motivação (estado que leva à ação, ao comportamento). Em O Grande livro das Emoções, discordo de algumas classificações deles como emoções - por exemplo, empatia e vingança. Esses são construtos mais complexos, que incluem emoções, mas também cognição, comportamento e motivação.

Para que servem as emoções?

As emoções ajudam o animal a identificar uma situação de risco ou de oportunidade, e mobilizam a ação – ou seja – fazem com que ele tome uma atitude rapidamente para não perder a chance de se salvar (em caso de risco) ou de perder uma oportunidade (por exemplo, de comer ou de se reproduzir). Um exemplo simples:

A zebra vê um leão. Imaginem se ela tivesse que raciocinar horrores para depois decidir o que fazer. Primeiro ela teria que ter um cérebro potente, capaz de muitos cálculos. Depois, isso levaria muito tempo, o que seria bem arriscado. 


Seria assim: ela vê o leão, o cérebro processa, aí identifica, “leão”, que categoria de animal é esse? Ah, um predador. Beleza. Um predador de que magnitude? Pesquisando no google...Um predador perigoso. Muito perigoso. Que faz o quê? Corre e te come. Tá. E o que eu posso fazer? Bom, há muitos comportamentos possíveis, tem que analisar melhor a situação. Tá chovendo? Procurar como enfrentar um leão na chuva... etc e etc



Nesse processo há muito gasto de tempo e energia (recursos preciosos!). Ao ver o leão, o corpo da zebra já dispara uma série de reações fisiológicas – a que chamamos de medo – que a levam rapidamente a fugir, enfrentar ou paralisar (são exemplos de três reações instintivas comuns dos animais).

E na gente, como funciona? A mesma coisa. 



As emoções são reações fisiológicas a partir de uma leitura rápida do ambiente, em que nosso corpo nos prepara para agir. Então está parecendo que as emoções são o contrário do racional. Sim e não.

Sim no sentido de que são reações muito rápidas, mais primitivas e compartilhadas com outros animais, BUT nós somos animais. Isso significa que elas continuam tendo funções importantes para nós.

E não são o contrário do racional no sentido de que nos ajudam a ler o ambiente, ou seja, nos proveem mais dados sobre o ambiente e sobre como deveríamos agir. Essa é a hipótese do marcador somático do Damásio:

hipótese do marcador somático envolve a ideia de que a emoção é parte integrante do processo de raciocínio e pode auxiliar esse processo, ao invés de atrapalhá-lo. O sistema de raciocínio teria evoluído como uma extensão do sistema emocional automático. O nome marcador somático vem do fato de que sentiríamos um estado somático, do corpo (emoção), que marcaria uma imagem. A emoção proviria ao cérebro um quadro do estado do resto do corpo, por isso “marcador somático” (em O Erro de Descartes).

Para ficar mais claro: as emoções nos ajudam a entender o ambiente, marcam as situações com um selo, com uma cor, com um tom, e isso nos ajuda a decidir o que fazer. Entrei em uma rua escura, tarde da noite, estou com medo. Isso já me deixa alerta, o que pode ser crucial para minha sobrevivência. Isso é irracional? Não! Se eu não sentisse medo, poderia ser descuidada, me expor mais e me dar mal.

Isso então significa que sempre as emoções fazem ótimas leituras do ambiente que sempre vão nos ajudar a nos comportar de modo ideal?

Não. Como todo sistema, tem falhas. Serve para grande parte das situações, por isso foi selecionado naturalmente, contudo isso não significa que sempre vai funcionar, que nunca precisaremos raciocinar mais para decidir o que fazer, que sempre nos levará à felicidade. Mas acredite, melhor com ele do que sem ele! Por quê? Porque assim temos mais dicas sobre como agir, com mais agilidade, com funcionalidade com relação ao ambiente.

As emoções mobilizam comportamentos, e de modo muito forte, mais do que o processamento racional consciente. Um exemplo pessoal: para ir à academia, costumo passar por uma rua deserta e escura, pois os postes de luz não funcionam. Tenho como fazer outro caminho, um pouco mais longo. Acontece que essa rua não me dá medo, parece uma falha do meu sistema de reconhecimento de perigo. Racionalmente, sei que é estupidez andar nessa rua sendo que tenho alternativa. Mas como não sinto, simplesmente sempre ando por ela, o que pode ser bem perigoso.

Exemplo do contrário: andar de avião. Nosso corpo lê a situação como perigo, porque é claro, quem em sã consciência vai entrar em uma máquina que voa?? Isso não pode estar certo!!! A leitura do ambiente pelo corpo é parcialmente correta, afinal, voar é perigoso para nós que não temos asas. Agora, em termos de raciocínio, sabemos que é muito mais seguro do que andar de carro, por exemplo. Mas temos mais medo do avião, e isso mobiliza muita gente a evitá-lo e a pegar um ônibus, o que estatisticamente é bem mais perigoso.

Usar o medo como exemplo é fácil, com ele conseguimos entender muita coisa. É só fazer o mesmo exercício para as outras emoções. Para que serve a alegria? Para me levar a repetir aquele contexto, aquele comportamento. E o nojo? Para eu não me arriscar a comer comidas duvidosas e morrer de intoxicação alimentar. E a tristeza? Para eu me afastar de uma situação, mudar algo na minha vida (em DivertidaMente, a função da tristeza é muito bem trabalhada, no caso, marcou uma situação de que a personagem não estava gostando, e assumir a emoção fez com que conseguisse ajuda dos demais). Esses são exemplos de emoções primárias (emoções básicas para Paul Ekman), temos as secundárias. 

Cada autor faz uma divisão diferente, para simplificar, entendo que as emoções secundárias exigem uma representação mental do outro superior ao caso das primárias. Algumas das secundárias: vergonha (devo rever meu comportamento, estou inadequado socialmente?), humilhação (alguém me lembrando da minha posição social de modo rude), inveja (quero o que o outro tem, como conseguir?), culpa (devo rever meu comportamento, estou fazendo coisas erradas), entusiasmo (quero fazer logo!), paixão (quero essa pessoa, aproximação para reprodução).

Voltando ao Grande livro das Emoções. Ele defende então que reconhecer as próprias emoções e as dos outros e lidar bem com elas é crucial para nos relacionarmos bem com as pessoas. E aí Daniel Goleman entra com Inteligência Emocional e diz coisa semelhante: o que é ser inteligente emocionalmente?Conseguir reconhecer emoções em si e no outro, conseguir controlar suas próprias emoções, conseguir se auto motivar, conseguir lidar com as emoções do outro.

Isso significa que inteligência emocional seja tudo na vida? Não! O próprio Daniel Goleman diz que estão superestimando o poder do QE, ele lembra que isso não é tudo na vida. Contudo, também não significa que seja irrelevante. Emoções são parte de quem somos, e quanto melhor lidarmos com ela, melhor para nós - para sofrer menos, agir mais adequadamente no ambiente, com os outros etc.

A questão é que ainda há muito mal-entendido sobre o que as emoções significam. Apesar da popularização do termo inteligência emocional, poucos compreendem que as emoções não são necessariamente o oposto do pensamento racional, e que são cruciais para nosso bom funcionamento.

Ou seja, o conselho "pense friamente" é uma fria. Pense sempre friamente e você será um psicopata (que tem dificuldade de sentir emoções), um ser nada desejado socialmente. O que também não significa que devemos seguir o que as emoções nos indicam sempre, como no caso do avião.

Essa discussão continua! Esse foi só o começo.



Para saber mais


O erro de Descartes – Antônio Damásio

Inteligência Emocional – Daniel Goleman


O Grande livro das Emoções - Esteve Pujol 

quarta-feira, 26 de março de 2014

Entrevista: Business Intelligence

Na revista Você S.A. de janeiro, a reportagem "Freud explica: salário de psicólogo é o que mais subiu" me chamou a atenção - boas notícias para minha área. Quando abro a revista, dou de cara com a foto do Arthur Nagae, que foi meu calouro de graduação na USP. Resolvi entrevistá-lo para entender um pouco melhor sua área de atuação, e também entender como a profissão do psicólogo vem mudando, entrando em novos nichos.


CientíficaMente - Arthur, o que você faz atualmente?

Sou coordenador da área de business intelligence na agência Wunderman, do grupo Newcomm. Estou lá há um ano (entrei como analista e fui promovido no último mês), e neste período trabalhei com contas de linhas aéreas, telecoms, bancos, e alguns outros clientes menores.



Para esclarecer um pouco, dentro da agência Business Intelligence é a área responsável pela coleta de dados, monitoramento, análise e reporte de desempenho das diversas ações publicitárias ou de performance em websites. Portanto meu trabalho é estar presente durante o planejamento da campanha para identificar quais dados deverão ser coletados, como e quais dados serão analisados para se medir desempenho e garantir que a implementação de todas as ferramentas de coletas de dados estejam Ok antes do início da campanha. Durante a campanha eu acompanho os resultados (que podem ser obtidos quase imediatamente através das ferramentas disponíveis atualmente no marketing digital, ou com um delay de no máximo 1 ou 2 dias), sinalizo possíveis problemas ou otimizações e reporto os dados parciais internamente e ao cliente. Ao final da campanha tenho que consolidar os dados totais, fazer os cruzamentos necessários para tirar aprendizados para serem usados nas campanhas futuras, montar um relatório final para compartilhar internamente e apresentar os resultados ao cliente.

CientíficaMente - Parece ser um trabalho bem interessante. E como você foi parar nele?

Foi mais uma questão de coincidência combinada com necessidade do que um planejamento minucioso. Estava no último ano da graduação e tive alguns problemas familiares que me fizeram passar a procurar vagas no setor organizacional. Participei de diversos programas de trainee (gestão de pessoas/RH), mas acabei não passando devi
do a falta de experiência no mercado e a alta competitividade.

No final do ano, prestes a me formar, surgiu a oportunidade de participar de um processo seletivo na empresa onde um ex-aluno da Psicologia USP (até então apenas um conhecido da minha irmã, mas que viria a ser meu cunhado) trabalhava, a dp6. É uma empresa voltada à inteligência em marketing digital, com um perfil de gestão mais jovem, onde o que contava era ter um perfil analítico e bom raciocínio lógico acima da sua formação (havia biólogos, outros psicólogos, graduandos em Direito, matemáticos, físicos e até um rapaz formado em Gastronomia). Passei pelo processo, mas devido a um acordo entre a dp6 e a Wunderman para estruturar uma área de BI dentro da Wunderman, eu entrei sob contrato da segunda. Durante este período fui treinado pelo pessoal da dp6, com quem aprendi muito do necessário para lidar com as demandas deste mercado. Porém, após alguns meses o acordo não pode mais ser mantido, houve um distanciamento das partes e eu permaneci na agência.

CientíficaMente - Quais são os maiores desafios do seu trabalho? 

Acho que o maior desafio é garantir que os dados que são coletados são os mais confiáveis possíveis para evitar qualquer tipo de problema durante as
análises. Requer conhecimento técnico apurado para entender todo o processo pela qual passam as informações, acaba sendo necessário boa comunicação e agilidade para identificar e alertar possíveis problemas, além de estar sempre com um pé atrás durante as análises para fazer o double-check de que tudo o que está vendo nas milhares de linhas do Excel são dados confiáveis. Tudo isso dentro de prazos normalmente apertados.


CientíficaMente - E quais são as alegrias?

Entre os maiores prazeres está construir algo que mostra de forma eficiente o resultado de todo o trabalho que as dezenas de pessoas envolvidas no planejamento e lançamento de uma campanha tiveram ao longo de semanas de estresse. Outra coisa é poder explorar informações volumosas sobre comportamento humano, compreender padrões de interação com peças de mídia por diferentes clusters de interesse, analisar testes A/B para verificar mudanças de comportamento entre populações, explorar a fundo a usabilidade de websites, etc. Enfim, alimentar minha curiosidade sobre o comportamento humano no ambiente digital. Além disso, estar inserido em um ambiente 100% digital é algo que me agrada muito.

CientíficaMente - Durante a sua graduação, no que pensava fazer após se formar?

Eu já tinha há bastante tempo algum interesse em Marketing, inclusive escrevendo alguns trabalhos tentando aproximá-la à psicologia, porém, até o quarto ano eu tinha certeza de que teria ao menos mais um tempo seguindo carreira acadêmica, me dedicando a um mestrado e talvez, dependendo de como as coisas seguissem, tentar um doutorado em Análise do Comportamento. Cheguei a fazer duas iniciações científicas na área, editorar o periódico científico dos alunos da Psico (a Revista TransFormações), participar de congressos e afins. Mas, como disse anteriormente, a partir do quinto ano achei que não seria mais viável continuar neste caminho naquele momento e comecei a me preparar para entrar no mercado organizacional. Inicialmente pretendia atuar em algo mais próximo da gestão de comportamento organizacional, em uma consultoria ou dentro de uma empresa. Cheguei a montar um grupo de estudos sobre OBM (Organization Behavior Management), fizemos contato com profissionais da área no exterior e até apresentamos um trabalho sobre o tema em um congresso. 

Minha proximidade com o marketing e a tecnologia sempre estiveram lá, e somado ao perfil analítico que necessariamente se desenvolve ao lidar com o meio acadêmico científico, o pessoal da dp6 achou que eu tinha uma boa combinação de recursos para atuar na área que atuo hoje.



CientíficaMente -  Como pensa que será seu futuro? Se vê fazendo algo parecido, ou algo totalmente diferente?

Após apenas um ano de trabalho na área é de se esperar que vejo um espaço enorme para crescimento pessoal. Quanto ao futuro da área em si sou otimista, pois ela ainda é jovem e possui muitos caminhos por onde seguir. Me vejo fazendo
algo parecido mas com uma amplitude maior de possibilidades e uma visão de mercado mais madura. Há muitas áreas que contam com a ajuda de BI: Arquitetura/Usabilidade de websites, Social Media, Marketing de Performance, Planejamento de campanha de mídia, Otimização de mecanismos de pesquisa, entre outras muito variadas, mas todas possuem em comum o fato de ter grande demanda de informações que requerem conhecimentos técnicos, raciocínio lógico e um bocado de compreensão de comportamento humano.

Muito obrigada pelas respostas, Arthur. Gostei de conhecer um pouco mais essa área de business intelligence. 

domingo, 12 de janeiro de 2014

Mãe, não vou fazer faculdade!

Se você fosse dono de uma grande empresa, contrataria uma pessoa que saiu da escola aos 12 anos, e que, portanto, não fez faculdade?

Não é sua realidade? Ok.

Imagine que essa mesma pessoa esteja dando conselhos sobre educação e sobre como conseguir um emprego. Daria ouvidos a ela?

                Pois bem, Dale Stephens é um americano que aos 12 anos saiu da escola. Preferiu cuidar de sua própria educação. Depois, fez provas para conseguir os diplomas de ensino fundamental e médio. Chegou a entrar na faculdade, mas detestou – achava que as pessoas iam para a faculdade para ir a festas e conhecer parceiros amorosos, e não para aprender, e acabou abandonando o curso. Hoje, tem uma carreira bem sucedida como empreendedor, e fundou o movimento Uncollege, algo como “não faça faculdade”, escreveu um livro e é conhecido mundialmente. Nada mau para quem parecia apenas um aluno rebelde, não?

                Dale pode ser considerado um aluno rebelde, em ótimo sentido. Não via graça no sistema escolar, e tinha muita vontade de aprender. Resolveu que iria fazê-lo por si próprio, ou melhor, que iria direcionar sua própria aprendizagem, indo atrás do que lhe interessava. Ao crescer, percebeu que o mundo acreditava que os jovens tinham que entrar na faculdade para serem considerados aptos a serem pessoas “de sucesso”. Não podia ser diferente.

Ao entrar na faculdade, percebeu que ela não prepara ninguém para a vida real, para os problemas que realmente terão que ser resolvidos. Conheceu muitas pessoas pouco interessadas em aprender, e mais focadas em “pegar” alguém em uma das dezenas de baladas que ocorriam a todo o momento – o interessante da faculdade era justamente o que acontecia entre uma aula e outra. (obs. Ao contrário do que se possa pensar, ele não é uma pessoa introvertida, pelo contrário, adora festas. Porém não acha que alguém deva pagar altas mensalidades e fingir que estuda para poder ter uma boa vida noturna).

Um exemplo de habilidade absolutamente essencial que em geral nem a escola nem a faculdade nos ensinam: como trabalhar em equipe. O professor passa um trabalho em grupo. Cena 1: Um faz sozinho e o resto se apóia. Cena 2: Dois fazem sozinhos e o resto não faz nada. Quando você chega em um emprego, por exemplo em uma empresa, vai ter que trabalhar em equipe. Você depende totalmente do trabalho de outras pessoas para realizar o seu, assim como outras pessoas dependem do seu trabalho. Aí começa o problema, porque não estamos preparados para isso.

Diplomas de graduação são antiquados, na visão dele. Hoje li no jornal O Estado de São Paulo que a falta de mão de obra especializada atinge 91% das empresas.

                “A criação de cargos cada vez mais específicos, o uso de equipamentos ultramodernos e a globalização dos negócios intensificaram o problema de mão de obra nas empresas.(...) Segundo Paulo Resende, professor da Fundação Dom Cabral, “os investimentos em tecnologia, inovação e automação estão fazendo com que a mão de obra fique mais escassa, pois não há treinamento especifico para os cargos. (...) Aqui [no Brasil] ainda não existe um alinhamento entre formação acadêmica e capacitação prática”.

                Ou seja, os cursos de graduação, em geral, nos preparam para empregos que não existem mais, em um mundo que já não é mais o mesmo.

 Responda à questão:

Por que você vai para a faculdade?

Se formos a fundo na questão, é uma resposta desafiadora.


Tudo bem, podemos até concordar, mas qual a solução mágica proposta por Dale, para substituir a graduação? Se a graduação pode não ser a solução, qual seria? A saída é você hackear a sua educação, exatamente o título do livro dele, Hacking your education. E o que isso significa afinal?

Simplesmente que você pode aprender fora das estruturas e das formas tradicionais de ensino, como nas escolas e nas universidades. Hacker significa alguém que constrói alguma coisa. Tem a ver com independência. Com tomada de decisão. Com autonomia. Com pro atividade. Dale se auto proclama um “hacker acadêmico”. Por que não?

Quanto mais você é uma pessoa crítica e independente, mais é capaz de traçar seu próprio caminho de aprendizagem. Veja, ele fala de  a-p-r-e-n-d-e-r  e não de colecionar diplomas para pendurar na parede, muito menos de fingir que esses diplomas garantem que você tem a capacidade de resolver problemas reais no mundo real (que é o que te faz conseguir e manter um emprego, diga-se de passagem). Tirando profissões que exigem mesmo um diploma, como medicina e direito, praticamente todo o resto é possível de ser “hackeado”.

No livro, Dale conta histórias de pessoas que não foram para a faculdade e que construíram seu próprio caminho, assim como ele. E assim, dá dicas de como podemos fazer o mesmo. Algumas delas:

·         Não pense no que um diploma pode te dar. Pense em como você pode conseguir as coisas que um diploma promete. Por exemplo: a experiência social, um emprego e simplesmente aprender alguma coisa.

·         Tente descobrir no que você é bom, no que gosta de fazer, no que te satisfaz. Pense em possíveis ocupações (por exemplo: escritor, professor, músico, artista, designer etc.). Depois, pense em como você pode ser bom nessa ocupação, que habilidades teria que ter? Finalmente, pense se um curso de graduação realmente te ajudaria, ou se há outras maneiras de desenvolver essas habilidades fora da sala de aula.

·         Compartilhe o que está aprendendo. Tenha um blog ou um site, por exemplo. Se você está na faculdade, a sociedade assume que você está aprendendo (mesmo que não seja verdade), mas se você não está, terá mais dificuldade de mostrar seus avanços nos estudos – e as pessoas podem achar que tudo o que você tem feito é ver televisão e jogar vídeo game.

·         Organize grupos de estudos. Descubra pessoas que estão aprendendo o mesmo que você e marque encontros periódicos, para trocar conhecimento e fazer networking.

·         Descubra como você aprende melhor e estude mais dessa forma. Não abandone outras formas de aprendizado, apenas gaste mais seu tempo com a forma que melhor aprende. Por exemplo, se você é mais visual, leia mais. Se é mais extrovertido e sociável, vá mais atrás de pessoas para trocar conhecimento.

·         Use a Internet para estudar! Há muitos sites bons – Cousera por exemplo, com vídeo-aulas. Encontre pessoas que estejam estudando o mesmo que você! Encontre bons blogs e fóruns, faça comentários inteligentes (pratique o bom português, uma habilidade que quase ninguém tem).

·         Vá fazer trabalho voluntário. Isso não significa necessariamente trabalhos sociais, você pode ser voluntário em alguma empresa pequena – trabalhando de graça. Por quê? Para adquirir alguma habilidade, para se autoconhecer (saber no que é bom, o que gosta) -  troque a sua falta de experiência pela falta de salário.

·         Procure mentores ou professores com quem você possa conversar, inclusive aqueles de universidades importantes. Identifique os especialistas na sua área de interesse e tente entrar em contato com eles. Envie um e-mail, diga que é interessado no assunto de especialidade dele, convide para um café. Peça conselhos sobre como aprender mais sobre o assunto, peça indicações de mais pessoas com quem possa conversar, livros para ler, sites para visitar.

·         Descubra o que está acontecendo nas melhores universidades na sua área de interesse, tente frequentar palestras, debates, encontros. Converse com as pessoas, saiba quais são os tópicos em alta, as novidades, conheça as pessoas.

·         Ensine o que já sabe para alguém, e peça que a pessoa te ensine algo. Exemplos: cozinhar algo, uma língua, como escrever bem, como fazer um site, jardinagem, futebol, dança etc.

·         Descubra uma biblioteca pública, leia livros e revistas de graça. Conheça pessoas interessantes no local, troque opiniões sobre um livro.

·         Viaje pelo mundo. Quer aprender inglês? Junte dinheiro e vá morar um tempo no exterior. Tenha outras visões, entre em contato com diferentes culturas e pessoas, amplie sua visão de mundo, tente conviver com o diferente. É uma habilidade essencial atualmente.



Dale não é contra alguém ir para a universidade, desde que você a utilize para aprender. Essas dicas e as outras que ele dá no livro podem ser colocadas em prática também enquanto você está cursando uma graduação. Não são incompatíveis, podem ser complementares.





      Aprender é um processo para a vida. Não é algo que ocorre somente quando você está em uma escola, é algo que ocorre desde que você estava no útero da sua mãe e vai ocorrer até a sua morte. Pode ocorrer dentro de uma escola ou não. Quando dou aulas de inglês, pergunto aos meus alunos: Em que momento vocês estão aprendendo inglês? E eles respondem: Durante a aula. Eu digo: Não, vocês estão aprendendo em vários momentos, quando usam um aplicativo no celular, quando leem algum termo na Internet, quando escutam uma música, veem um filme. Quando vocês aprendem português? Nas aulas da escola? Não, você aprende desde que era um feto, e vai continuar aprendendo até o último dia da sua vida. E se você for esperto, vai ampliar e direcionar esses momentos de aprendizagem, para maximizar suas competências.

Acreditar que só se aprende dentro de uma sala de aula com a presença de um professor é uma visão ingênua do que significa aprendizado, e mais, uma visão passiva. Você é capaz de dar os passos para conseguir aprender algo e de tomar boas decisões que te ajudem a chegar lá. Você pode e deve pedir ajudar das pessoas, mas não necessariamente ser dependente de um professor e de uma instituição.



 Para saber mais: 

O livro Hacking you Education não foi traduzido ainda, li em inglês no meu kindle, comprando pela Amazon.

Dale Stephens fundou o movimento UnCollege, e mantém um site sobre o assunto.

Descobri esse curso no Hub Escola: Hackeando sua educação – autoeducação como um estilo de vida. O propósito do curso:

Criar espaços de conversas sobre a autoeducação e uma nova maneira de pensar a educação levando isso para a prática no desenvolvimento das pessoas e para o dia a dia delas.
O participante pode esperar aprender mais sobre si mesmo e sua maneira de aprender, sua relação com o aprendizado e ter maior poder sobre sua autoeducação.

Parece interessante, mas não fiz o curso e não posso dizer se é bom, se alguém já fez, por favor, compartilhe sua experiência.

Para saber ainda mais:

Precisa de um emprego? Invente-o! 

Tese de doutorado sobre aprendizagem auto-dirigida: Um estudo exploratório sobre a autodireção em ambientes informais - Sobre como os adultos vão atrás de aprender algo, direcionando sua própria educação.

Livro The Personal MBA: Master the art of business - Um MBA custa uma fortuna, e muitos o consideram essencial para alavancar a carreira.Como ter resultados melhores sem fazer o curso.

Livro The education of millionaires: everything you won´t learn in college about how to be successful - As pessoas bem sucedidas não aprenderam os fatores cruciais do sucesso na escola e na faculdade.